E foi exatamente assim, sem medo, nem reservas, nem receios e com toda a determinação do mundo que a rainha pop, que vai muito além deste "pequeno cognome" que lhe atribuíram, subiu ao palco e durante duas horas e 53 anos de idade, presta homenagem à arte da música, à arte da dança, à arte coreográfica, à arte da interpretação, à arte dos efeitos visuais, à arte do design e da estética, em suma, à arte da criação artística. Mas Madonna não se resume a apresentar um mero concerto, uma simples sequência ritmada e prevista de composições musicais produzidas e repetidas pela artista até à exaustão. Não, evidentemente que a diva já ultrapassou esse conceito há algumas décadas, acompanhada por alguns apenas, aqueles que conseguem ver a arte da música para além do elementar registo de chegar ao palco e cantar um conjunto de versos com a cadência certa e sem desafinar.
Claro que a diva pop já não se contenta apenas com aquilo que todos fazem, limitando a música na extensão de tudo o que esta pode proporcionar enquanto manifestação artística.
A diva faz questão de colocar o "dedo na ferida" ou em várias, não fosse ela desde sempre um ser provocador, com um gosto inabalável por "enfiar os dedos nos olhos" dos que não querem ver, em relembrar temáticas polémicas e sensíveis aos que as preferem esquecer.
Desta vez a diva apostou no exagero e aborda ostensiva e, por vezes violentamente, essas mesmas temáticas. Desde a hipocrisia religiosa, cultural e política, a sátira às relações e à valorização humana na sociedade atual, a violência dos contrastes sociais e humanos, até aos impactos do capitalismo e do consumismo no desequilíbrio das relações político-económicas entre nações, várias são as problemáticas que, de modo mais direto ou mais subliminar, estão presentes nesta tournée. Sim, os temas já não são novos. Desde sempre que a diva espeta o dedo em algumas destas chagas mas, desta vez, fá-lo de forma genial, superior. Não houve momentos menores neste concerto, todos podem adjetivar-se de muito bons ou excelentes.
Com segurança e mesmo comparando com a anterior tournée Sticky & Sweet, este foi o maior espetáculo a que já assisti, quase certo de que dificilmente virei a presenciar algo que se lhe possa superiorizar, tomando o conjunto de variáveis em referência.
Madonna é a prova viva de que há sempre margem para a ambição humana de prestar um bom trabalho à comunidade ... sim, pode-se falar em trabalho à comunidade. É a prova de que ainda é possível suplantar-se a si própria, ainda que isso pareça uma tarefa quase impossível.
Madonna é sinónimo de força, de exigência, de persistência e determinação. É demonstração de poder e querer pessoal, é estar em sistemático estado de vigília sobre o que nos rodeia. É um exemplo para todos e é isso o mais importante na cantora, mais do que o facto de o ser ... cantora.
Brama
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